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Leitor e estudioso de literatura (crítico literário e doutras artes) frequentando o curso Literatura Moçabicana na FLCS (UEM).
- - Você estava a fazer da N1, tua Estrada.
- - Mas a estrada era tecnicamente minha chefe… deixa nos lá viajar - repliquei
- - Quando quase perdias a estrada e derrapavas nas pedrinhas da beira da estrada, criaste uma poeira que, se o carro que te seguia não tivesse parado e os que vinham à traz desse fizessem o mesmo, não imaginamos o escândalo que teria causado.
- - Por favor chefe, nos lá ir, foi só um drift Sr. Não tem nada de mais nisso, até porque a curva não permitia fazer outra coisa. Na velocidade que vínhamos, teríamos caoptado!
- - Hey, miúdo, nós vos acompanhamos desde que saíram de Maputo, temos imagens captadas por um drone, podemos mostrar tudo se tiver um tempinho.
- - Por favor!
- - Não. – Tirando o bloco de multas e indo à frente da Besta e para anotar a matricula,
- - Não nos multa Sr. Autoridade. Sou um Bila empolgado a caminho de casa. Apenas isso, tou tão feliz e empolgado e mal vejo a hora de ver os familiares depois de tantos meses. Chefe, pega lá isto para um refresco - estendi-lhe um conjunto de notas amarfanhadas.
- - És Bila de onde?
- - Chikhumbane Chefia.
- - Olha, por consideração a isso eu não lhe vou dar a multa. Mas não vou deixar de lhe confiscar isso. – Apontando para um par de botijas entre as cadeiras do motorista e do passageiro. – Por todo amor com as vossas vidas vou ter que confiscar isso.
- - Não!... – Implorei. – Leva tudo que te apetecer dentro e fora deste carro, tudo, menos estas coisas.
- - Esses objectos virão comigo. Isso é um favor para as vossas pobres almas.
- - Sim Chefe, pode levar. Pai de Edimilson pode começar a desmontar – era uma voz feminina que vinha do acento de trás. Trazia um menor feliz com a adrenalina.
O chefe dessa família estava sentado ao meu lado, queria mostrar-lhe que, igual ou melhor que ele, eu também tinhas habilidades na condução de automóveis. São tantos os dias que, vindo das maiores faras, admirávamos as suas habilidades, sobre tudo quando evitava acidentes ou embates. O domínio do travão brusco. Já não podia fazer aquilo, ele vasculhou no porta-luvas chaves para desmontar. Quando ele entregou as botijas untadas ao Polícia de Transito, eu também saí do carro murmurando.
- - Perdi vontade de conduzir.
- - Eu conduzo – disse ela abrindo a porta e entrando na que eu acabava de sair. Eu abria o porta malas e de seguida o colmen, tirei uma 2M grande, bem jelada, seria a minha primeira cerveja do dia.
Os Moçambicanos já se alimentam mal, nem o plano de saúde têm, isso para não dizer que eles só visitam, regularmente, o médico quando estão sob o tratamento de Tarv, não porque não querem, mas porque as suas condições financeiras são proibitivas. Sobe o preço do Xapa, e, desta vez, as pessoas continuam suas vidas com tanta naturalidade como se ontem se tratasse... Os passageiros que se fazem aos seus postos de trabalho de MyLove (residentes de Boquisso, na sua maioria, onde eu faço parte) para alem de passar por grandes sacrifícios e de condições pouco aceitáveis, sofreram um ajustamento mais agravado por conta das covas que se encontram naquelas vias. Hoje, quando vinha à cidade, onde estou a escrever isto, duas senhoras conversavam de viva voz, uma delas suportava o meu braço que se encontrava apoiado no ombro dela. A outra gabava se dizendo que a sua patroa implorou-a para ir ao trabalho. Gabava se dizendo que chegaria no Zimpeto e que faria das suas com maior lentidão, depois ligaria para ela a dizer que chegara a Zimpeto a pé pois no Boquisso tinha carência de transporte mas, quando a sua patroa ligou, a sua foz não foi mais altivo como antes, o seu timbre vocal era submisso e tudo que dizia iniciava com a palavra “Senhora” por exemplo: “Sinhora, consegui subir um Xapa que me tirou de Boquisso... ” Ela ia ganhar o seu pão de cada dia, para alimentar os Xapas e Xapeiros. Jeremias Gwenha, que Deus proteja sua alma, já dizia na sua música que trabalhamos para o Xapa. Quando o MyLove na terminal, o motorista, que tinha a bochecha toda enxada até o nariz, disse para todos que hoje o preço continuaria o mesmo, que nos preparássemos para no dia seguinte pagarmos 5 meticais a mais, diferente de outras vias que só sofreram o reajuste de 3 meticais. Dois jovens discutiam, enquanto o motorista passava por eles, um dizia que Boquisso tinham mais molwenes, outro que Mukhatine é que tinham mais, isso para dar a intender ao motorista que, se cobrasse um centavo a mais, veria a cobra tomando chá com bolachas. O motorista contestou, enquanto recolhia o dinheiro: “Vocês pensam que alguém vai preferir entrar no Boquisso e bater covas quando podiam chamar Ntsivene e mesmo assim cobrar 10?” Um passageiro defendeu o motorista dizendo que a actual carência de transporte que se faz sentir naquele bairro em expansão iria agravar-se, se não reajustassem o preço. É com muita angústia que escrevo isto, numa altura em que há novas descobertas de recursos naturais no nosso país, e que, os efeitos da dívida pública oculta se faz sentir em cada um dos Moçambicanos que se acotovelam a cada dia, para sobreviver face a este mísero senário. Fico mais angustiado quando lembro que é por contado dos Brancos (credores), esses humanos de pele esfolada que, a tanto tempos atrás vieram deixar, nessas terras, a suas avareza e egoísmo. Não é este mundo que quero dar ao meu filho. Um filho meu que vier a este mundo, será por acidente, não planejaria um filho para vir testemunhar isto!
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